11/08/2008

Compensações da escrita.

Os ossos do corpo todo estralaram e a cadeira rangeu quando me sentei. Com uma xícara de chá quente e doce do meu lado e o pijama confortável vestindo o corpo cansado, estava preparada para dar início à missão. Respirei fundo e lentamente, sentindo bem o ar inflando os pulmões e fugindo de dentro deles logo depois. Deixei os olhos percorrerem todo o ambiente à minha volta. A blusa ensopada de chuva estava sobre a cadeira e a cortina escondia o vidro da janela fechada, apesar disso eu sabia que a tempestade ainda não tinha acabado. Os trovões e raios não escondiam isso de mim, mas eu não me importava mais com isso. O barulho da chuva caindo contra o mundo lá fora gerava dentro de mim certa inspiração inquieta. E era exatamente disso que eu precisava.
Voltei meus olhos para a tela acesa à minha frente e umedeci os lábios. Os dedos já se agitavam sozinhos, pareciam ansiosos com o que viriam a fazer em breve. Conheciam aquele território todo subdividido, cheio de sinais, e estavam prontos para transmitir à muitos alguéns espalhados por aí tudo o que eu poderia pensar e dizer em uma fração de segundo. Minha válvula de escape estava bem ali, sob meus dedos ágeis. Não demoraria muito e eu estaria livre de tudo... Com a mente e a alma bem mais leves do que antes.
Tomei um gole de chá e o deixei que me aquecesse por dentro, como eu queria. Encostei a ponta dos dedos no teclado e já me senti um pouco melhor. Só faltava um último suspiro de inspiração pra que eu me sentisse completa e totalmente preparada... Quando o que eu esperava aconteceu, não me contive mais. Os dedos começaram a trabalhar rapidamente, descarregando tudo que estava aprisionado dentro de mim há algum tempo já. Entre tantas janelas fechadas naquele mundo temporariamente tempestuoso, deixei uma aberta pra que pudesse me servir de confessionário. Como se sentisse falta da umidade da chuva, ela me exigiu água... E eu lhe entreguei todas as lágrimas que pude - e quis, por que não dizer? - extrair de mim.
Quando a missão se concluiu, não recebi nada em troca. Nenhum agradecimento, nenhum consolo, nenhum sinal... Apesar disso, o alívio foi profundo quando a janela se fechou e a tela se apagou. Com a xícara já vazia de chá na mão, me encontrei sozinha na cozinha, minutos depois, carregando dentro de mim uma paz sem definições e uma das conclusões mais corretas que já tirei durante toda minha vida: eu entendo as palavras assim como elas me entendem, e isso compensa tudo.


"November came down hard this year
And I saw you standing clear of the rain
Falling free but I was ready to finally come clean"
(Maria Mena).

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